A Religião sob Ponto de Vista da Sociologia
Durkheim comenta: Diz que a ciência, em principio, nega a
religião. Mas a religião existe. Constitui-se num sistema de fatos dados. Em
suma: ela é uma realidade. Como poderia a ciência negar tal realidade?
“Não existe religião alguma que seja falsa”. A religião é uma
instituição, e nenhuma instituição pode ser edificada sobre o erro ou uma
mentira. “Se ela não estivesse alicerçada na própria natureza das coisas, teria
encontrado, nos fatos, uma resistência sobre o qual não poderia ter triunfado.”
Que ocorre quando a secularização avança, o utilitarismo se
impõe e o sagrado se dissolve? Roubados daquele centro sagrado que exigia a
reverencia dos indivíduos para com as normas da vida social, as pessoas perdem
seus pontos de referencia. Sobrevém a anomia.
E a sociedade se estilhaça sob a crescente pressão das forças
centrifugas do individualismo. Se é possível quebrar as normas, tirar proveito
e escapar ileso, que argumento utilitário pose ser invocado para evitar o
crime?
O sagrado é o centro do mundo, a origem da ordem à fonte das
normas, a garantia da harmonia. Assim, quando Durkheim explorava a religião, ele
estava investigando as próprias condições para a sobrevivência da vida social.
E é isso o que afirma sua mais revolucionaria conclusão acerca da essência da
religião.
Segundo Rubem Alves a essência da religião não é a idéia, mas
a força. “O fiel que encontrou em comunhão com seu Deus não é meramente um
homem que vê novas verdades que o descrente ignora. Ele se tornou mais forte.
Ele sente, dentro de si, mais força, seja para suportar os sofrimentos da
existência, seja para vencê-los”. O sagrado não é um circulo de saber, mas um
circulo de poder.
Durkheim percebe que a consciência do sagrado só aparece em
virtude da capacidade humana para imaginar, para pensar um mundo ideal: coisa
que não vemos nos animais, que permanecem sempre mergulhados nos fatos.
Os homens, ao contrario, contemplam os fatos e os revestem
com uma aura sagrada que em nenhum lugar se apresenta como dado bruto, surgindo
apenas de sua capacidade para conceber o ideal e de acrescentar algo real. Na
verdade, o ideal e o sagrado são as mesmas coisa.
E chegou mesmo a afirmar que “existe algo de eterno na
religião que está destinado a sobreviver a todos os símbolos particulares nos
quais o pensamento religioso sucessivamente se envolveu. Não pode existir uma
sociedade que não sinta a necessidade de manter e reafirmar, a intervalos, os
sentimentos coletivos e idéias coletivas que constituem sua unidade e
personalidade”.
A religião pode se transformar. Mas nunca desaparecerá.
Marx vê na
religião a expressão maior da alienação, porque a religião fala do outro mundo
e do céu como a situação reconciliada, da pura felicidade, sem conflitos e
contradições. Para Marx importa descobrir este mundo, conflititivo, miserável e
não celestial. Enquanto a religião ocupa a mente do proletariado com o discurso
do outro mundo, o impede de descobrir este mundo e de lutar para transformá-lo
e ai sim, poder falar-se eventualmente num céu. A religião apresenta uma teoria
fantástica do mundo; importa construir a teoria real do mundo real. Daí o
combate de Marx a religião. Marx procurou compreender a função concreta da
religião: ela é, em primeiro lugar, expressão da miséria (“suspiro da criatura
em agonia”). Em segundo lugar, a religião é também um protesto contra a
miséria.
Para Marx
a critica da religião ajuda a desenvolver no proletário a consciência critica e
faze-lo descobrir a realidade conflitiva sem ilusão e sem inversão de
espiritualista, apresentados pela religião. Em lugar de interpretação religiosa
da miséria deve ir a interpretação critica e cientifica. Este é o propósito de
Marx.
Marx não
se opõe, sem mais a religião, opões-se ao efeito social alienador que a
religião pode propagar.
Diz que se
deve salvaguardar a liberdade de consciência de cada um, mas ao mesmo tempo,
lutar para que a religião não distorça a compreensão da miséria e não projete
para o outro mundo a solução de problemas cuja solução deve ser encontrado aqui
mediante a consciência critica a organização do proletariado e a luta
revolucionaria (Revista de cultura vozes nº. 6, 1987, p. 694).
Segundo Freud, a religião
nasce fundamentalmente de uma recusa, por parte da consciência, em aceitar a
“realidade”. È um ato de rebelião pelo qual o principio do prazer nega a
realidade instaurada o status de realidade, substituindo-a por um mundo
imaginário que realmente represente os impulsos eróticos reprimidos pela
civilização, mundo este que passa a funcionar, para a consciência, como
realidade. Tal atitude da consciência – Freud denominou neurose – e as
construções que dela emergem, são, segundo o pai da psicanálise,
fundamentalmente disfuncionais frente à sociedade. Por isto, elas devem ser
reprimidas ou pela força ou voluntariamente.
Feuerbach afirma: “A religião é o solene desvelar dos
tesouros ocultos do homem, a revelação dos seus pensamentos mais íntimos, a
confissão publica dos seus segredos de amor”.
E ele continua: “Como forem os pensamentos e as disposições
do homem, exatamente isso e não mais será o valor do seu Deus. Consciência de
Deus é autoconsciência, conhecimento de Deus é autoconhecimento”.
Assim, se a psicanálise dizia “conta-me teus sonhos e
decifrarei o teu segredo”, Feuerbach acrescenta “conta-me acerca do teu Deus e
eu te direi quem és”. Deus é a mais alta subjetividade do homem... Este é o
mistério da religião: O homem projeta seu ser na objetividade e então se
transforma a si mesmo num objeto perante
essa imagem, assim convertida em sujeito”.
É o homem quem fala, das profundezas do seu ser, numa
linguagem que nem ele mesmo entende. A despeito disso, fala sempre a verdade,
porque diz dos seus segredos de amor e anunciar o mundo que poderia fazê-lo
feliz.
A religião é um sonho. Mas sonhos não nos encontramos nem
vazio como pensava o empirismo, nem nos céus, como afirmavam os teólogos, “mas
na terra, no reino da realidade. O que ocorre é que nos sonhos vemos as coisas
reais no esplendor mágico da imaginação e do capricho, em vez da simples luz
diurna da realidade e da necessidade”.
O mundo sagrado não é uma realidade do lado de lá, mas a
transformação daquilo que existe do lado da cá.
Leonardo Boff argumenta que a religiosidade pode ter valor de
ação social e política potencializando ainda mais a força da mobilização
libertária. É na religião que se articulam os grandes temas que movem à
consciência e as buscas humanas radicais. A religião expressa uma experiência
irredutível que transcende o homem.
A religião ensina aquilo que mais falta ao projeto da
tecno-ciência que opera o desenvolvimento-crescimento de nossas sociedades: o
respeito pela alteridade, o reconhecimento de que as coisas valem por si mesmas
e não apenas porque nos são úteis, pois elas representam uma revelação do
Criador e têm direito de continuar a existir, pois não fomos nós que lhe demos
existência. Alimentar a solidariedade generacional.
Weber concentrou a sua atenção nas religiões ditas mundiais,
aquelas que atraíram um grande número de crentes e que afetaram, em grande
medida, o curso global da história. Teve em atenção à relação entre a religião
e as mudanças sociais, acreditava que os movimentos inspirados na religião
podiam produzir grandes transformações sociais, dando o exemplo do
Protestantismo.
Para Weber, as concepções religiosas eram cruciais e
originárias das sociedades humanas, pois o homem, como tal, sempre esteve à
procura de sentido e de significado para a sua existência; não simplesmente de
ajustamento emocional, mas de segurança cognitiva ao enfrentar problemas de
sofrimento e morte (Ó Dea, 1969). Procura-se na religião signos de
transcendência e de esperança. Assim, Weber estava preocupado em destacar a
integração racional dos sistemas religiosos mundiais e não apenas o calvinista
(objeto especial dos seus estudos), como resposta aos problemas básicos da
condição humana: “contingência, impotência e escassez”. Weber mostra que as
religiões, ao criar respostas a tais problemas – respostas que se tornam parte
da cultura estabelecida e das estruturas institucionais de uma sociedade –,
influem de maneira mais íntima nas atitudes práticas dos homens com relação às
várias atividades da vida diária (Ó Dea, 1969). Com isto, Weber considerava
que, ao problema humano do sentido e significação existencial, a religião, de
maneira eficaz, oferecia uma resposta final. Por conseguinte, como já
afirmamos, ela torna-se, pela forma institucional que assume um fator causal na
determinação da ação. No caso específico do protestantismo, a sua força é vista
como indispensável (mas não a única) para o surgimento do fenômeno da
modernidade ocidental, com seus valores inerentes de individualismo, liberdade,
democracia, progresso, entre outros. Portanto, segundo a teoria de Weber,
religião é uma das fontes causadoras de mudanças sociais. Para ele, o processo
de racionalização religiosa ou de “desencantamento do mundo” culminou no
calvinismo do século XVII e em muitos outros movimentos, chamados por ele de
“seitas”. Desse momento em diante, procurou-se assegurar a salvação (temporal e
eterna) não por meio de ritos, ou por uma fuga mística do mundo ou por uma
ascética transcendente, mas acreditando-se no mundo pelo trabalho, pela profissão,
pela inserção (Fonte http://www.educomvida.com.br). Analistas como S.
Huntington, cientistas como E. Wilson e pensadores como Hans Küng têm
enfatizado ultimamente a importância política das religiões como formadoras da
cosmovisão mais generalizada entre os povos, como fundamento da ética das
culturas e como uma das forças maiores que mobilizam as pessoas até o ponto de
entregarem suas vidas por suas convicções. As religiões conhecem hoje no mundo
inteiro um grande rejuvenescimento. O cansaço da racionalidade e da
funcionalidade do mundo moderno abriu espaço para a volta do místico, do
religioso e do esotérico. Estes se movem nos parâmetros da razão sensível e
simbólica e menos na racionalidade analítica. Dado o processo avassalador da
globalização que tende a nivelar as diferenças culturais, as religiões se
transformaram em lugares privilegiados de resistência. Quanto mais às culturas
se sentem ameaçadas mais encontram na religião uma força de preservação dos
símbolos e valores que lhes dão identidade. Essa pressão faz com que surja o
fundamentalismo que não é uma doutrina, mas uma forma de interpretar a
doutrina, como a única verdadeira, negando às outras verdades e por isso
legitimidade. Esse fundamentalismo pode se transformar em terrorismo quando se
passa a atacar e a eliminar os opositores. A motivação é política e sua
sustentação ideológica é a religiosa[1]
[1] Rubem Alves – O que é religião? http://www.educomvida.com.br/entrevistas/leonardo-boff-a-religiao-deve-conscientizar-e-nao-amedrontar-ao-
transformar-danos-ambientais-empecado/